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Vol. 03 – Nº 06 – 2022

Antropofagia Reversa ou A subversão do Brasil perante as lentes internacionais da cultura

O conceito de antropofagia sempre esteve presente em discussões de viés artístico. Na raiz de seu significado, antropofagia é o ato de consumir a carne humana com o intuito de adquirir seu conhecimento, força e/ou energia. Partindo deste preceito, na cultura brasileira a Antropofagia começou a aparecer na famosa Semana de Arte Moderna de 1922, e se consolidou em 1928, a partir da publicação do Manifesto Antropofágico, encabeçado por Oswald de Andrade, que visava acabar de vez com qualquer movimento artístico eurocêntrico, buscando dentro do próprio Brasil, em seu povo, conteúdos para a produção de uma identidade artística nacional. Um dos principais ícones desta época é a obra O Abaporu, de Tarsila do Amaral, que foi esposa de Oswald de Andrade.

O que o presente texto traz, na verdade, é uma antítese da antropofagia. O movimento prega a paixão pelos ícones e paisagens brasileiras, além da exaltação da arte nacional como autossuficiente e bela aos olhos de quem a aprecia, tal como as cores verde e amarela da bandeira do Brasil, recentemente usurpada por grupos de extrema-direita com ideologias fascistas.

O país com orgulho de sua cultura, cores e sabores agora é palco de algo desastroso, que vai na contramão de tudo que Tarsila do Amaral, Oswald e Mário de Andrade sempre defenderam: a independência de nossa identidade artística e cultural.

Após as eleições de 2018, da qual o candidato Jair Bolsonaro saiu vitorioso, vimos o nosso Ministério da Cultura se esfarelar em migalhas e, com ele, várias leis de incentivo à cultura minguarem junto com nossa imagem na comunidade internacional.

O que está acontecendo?

Exatamente o contrário do que defendiam as maiores figuras artísticas das vanguardas antropofágicas: a submissão do Brasil às culturas internacionais, sobretudo a dos Estados Unidos. Um país que foi berço de um movimento tão grande, que proporcionou a entrega de obras incríveis como Macunaíma (1969) e as Bachianas Brasileiras (1947) agora rasteja aos pés do “Tio Sam”.

Mas não para por aí: a bandeira verde e amarela, que desde seu lançamento foi motivo de orgulho para os brasileiros, agora foi engolida pelo ódio e desprezo nacional e internacional. O consumo de nossas cores, que já pintaram obras de grande valia para o Brasil, agora está nas mãos daqueles que defendem o seu fim.

O resgate da soberania brasileira e de suas cores será feito gradativamente, assim como foi sua usurpação. A população brasileira precisará aprender a consumir e organizar os conceitos do próprio país para que esta recuperação seja feita de maneira saudável e revigorante. É hora de aplicar os conceitos de consumo da própria cultura e aprender mais com nossa arte sobre a descentralização da cultura estadunidense/eurocêntrica do nosso povo. O Brasil tem cor, tem história e tem memórias!

Não só de bandeira viverá o brasileiro…

Apesar da entrega cultural que o governo Bolsonaro fez aos gringos, este comportamento de suprimir nossos costumes em detrimento de outros países não é novo. Por sermos uma nação jovem, ainda carregamos marcas eurocentradas desde o período colonial que serão difíceis de superar. A cultura brasileira se mistura com a europeia como se fosse um grande mexido servido em um PF. A solução para esse problema é a conscientização e a exaltação da independência cultural brasileira.

E onde entra a Antropofagia neste processo?

A Antropofagia é a antítese da destruição cultural local. Portanto, reconstrução.

A ideologia pode ajudar o país a voltar aos eixos no destaque de sua cultura a partir do momento em que seu povo virar protagonista de suas produções artísticas. É o cinema feito de brasileiros e se alimentando de brasileiros!

Aos poucos, o entendimento acerca de nossa bandeira e nossa soberania poderão ser restabelecidos pois, trabalhando desta forma, o público poderá perceber que a pátria não pertence a um político, uma figura importante ou a alguém insignificante, mas sim ao mesmo povo que desenvolve suas raízes culturais diariamente.

O exemplo da foto é um protesto que reivindica a verdadeira bandeira do Brasil, com cores e identidade indígenas, já que as cores verde e amarelo também sofreram influências imperialistas da época em que o Brasil era uma colônia europeia. Somos indígenas, somos independentes, e fomos todos usurpados.

Matheus Alvarenga é jornalista e atualmente é redator na Rede Vitória de Comunicação. Já produziu conteúdo cultural para os 78 municípios do Espírito Santo através de pesquisas de campo para um portal de turismo capixaba.

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